segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

As relíquias da morte são três

A capa da invisibilidade, a pedra mágica, que nos dá a falsa sensação de poder rever seres queridos que já se foram e a estaca fina, feita com o galho do sabugueiro.
Tudo para mostrar que o ser arrogante, aquele que não cansa de se dar bem, um dia, quando menos espera, se dá mal.
O ser que vê através da pedra seus desejos se realizando, um dia, sente tantas saudades, e acaba se matando para estar mais próximo do objeto que viu.
O ser que veste a capa para tornar-se invisível, de tanto se proteger, perde a graça e o sentido e passa a capa adiante, para um novo ser igualmente assistir a tudo e não aparecer. Lendas e mitos. Querem nos provar o tempo todo que o bom é não se expor.
... Viver quietinho, na sua, devagarinho e chegando lá.
Mas na era em que vivemos, com a comunicação em massa, a midia aterrorizante, os satélites dominando a órbita, a aceleração dos corpos, as ondas de rádio atravessando o céu e suas camadas, as ondas de calor e os raios UVA e UVB nos queimando, os meios de transportes terrestres, coletivos ou não, engarrafados aqui embaixo, o lixo espalhando-se pelos mares e pelos ares, quem consegue vestir a capa da invisibilidade?
Só os seres excluídos.
São eles mesmos: meninos de rua, bandidos pequenos, pés de chinelo, mendigos, bruxos e bruxas. As relíquias do nosso mundo acabam por ser os que vivem em esconderijos e nas cavernas, em lugares distantes. Essas raridades, esses fora da lei, esses agentes apartados da sociedade.
Só eles não se expoem, ninguém sabe seus nomes.
Capa, pedra e estaca, os seres que nos incomodam têm os três objetos.
A gente vive pra descobrir, que no final das contas, realizar é bom, trabalhar é bom, ser solidário é bom; ser solitário, não. Os excluídos têm uma imensa tristeza por não poderem dividir seus objetos com ninguém.
E saber ou não saber, ser ou não ser, ter ou não ter, eis a questão, não adianta nada. Só se constrói alguma coisa com a aproximação.
Na luz, nas trevas ou na transparência.
Falando nisso, o filme "Enterrado vivo", lançado no Brasil em dezembro de 2010, tem me intrigado. Depois dele, deveriam instituir uma lei para que quando fôssemos enterrados, levássemos junto de nosso corpo, no caixão, um telefone celular. Vai que dá uma vontade "do além" de ligar para...?

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